PNE Aprendizagem adequada durante a alfabetização ainda é maior desafio

21 de julho de 2014 - 13:25

Universalizar a educação infantil, alfabetizar todas as crianças até o final do 3º ano do ensino fundamental, fomentar a qualidade da educação básica e investir 10% do Produto Interno Bruto (PIB) em educação são algumas metas do Plano Nacional de Educação (PNE), sancionado no último dia 26 de junho, pela presidente Dilma Rousseff. Aprovado com três anos de atraso, o Plano é composto por 20 metas que deverão ser alcançadas nos próximos dez anos (até 2024).

No Ceará, 93% das crianças de 4 e 5 anos estavam na escola em 2012 (239.205) e a meta é atingir 100% até 2016. Apesar da quantidade significativa, superior inclusive à média nacional (82,2%), chama a atenção a má qualidade do ensino, revelada pelos baixos índices de aprendizagem. Levando em conta que uma criança só é considerada alfabetizada quando se apropria da leitura e da escrita como ferramentas essenciais para seguir aprendendo, desenvolvendo a sua capacidade de se expressar e de participar do mundo cultural no qual está inserido, o cenário não é nada animador.

Aprendizado

Em todo o Estado, apenas 42,15% das crianças do 3º ano do ensino fundamental apresentaram aprendizado adequado em leitura. Porém, a situação mais preocupante é a do aprendizado adequado em matemática (18,83%) e em escrita (18,44%), ainda muito aquém do esperado – 100% até 2024. Em relação à média nacional, os índices do Ceará também estão bastante inferiores. O porcentual de todos os estados foi de 44,54% de aprendizado adequado em leitura, 33,33% em matemática e 30,09% em escrita.

Aos 5 anos, Ana Lívia Silva, aluna da Escola Municipal Mozart Pinto, no bairro Jardim América, ainda não sabe fazer contas, mas já se encanta pelo universo da leitura. Ao ser questionada sobre qual era o seu nome completo, de prontidão começou a soletrar letra por letra. “O que eu mais gosto é de conhecer letras”, enfatiza. Ela conta que na escola aprendeu a ler histórias. As suas preferidas são da Mônica e sobre duendes.

Já Raíssa Costa da Silva, 5, tem como histórias preferidas as do Saci Pererê. Ela também gosta de desenhar, mas diz que a sua atividade preferida é brincar com os colegas na sala de aula. Apesar de afirmar que gosta de fazer contas, Raíssa confessa que tem dificuldades, mas tem a ajuda do pai em casa. “É difícil. Eu não sei, porque só tenho 5 anos”, justifica.

Jacqueline Lucas Costa Lima, professora do Infantil V da Escola Mozart Pinto comenta que geralmente as crianças têm dificuldade de raciocínio e interpretação de texto. Um grande problema que identifica é a falta de diálogo, acompanhamento e estímulo por parte dos pais em casa. “Leitura e interpretação textual é o que mais se batalha na escola, mas não tem continuidade em casa. O professor tem que fazer milagre, pois o que as crianças aprendem é em sala de aula. Em casa, falta estímulo para elas pensarem”, ressalta.

Outra crítica que faz é em relação à aprovação progressiva. Trata-se dos alunos que são matriculados de acordo com a idade, e não com nível em que estão. “Isso é muito prejudicial, o professor não tem como dar atenção a um só aluno. A criança do terceiro ano que não sabe ler e nem escrever vai se sentir diminuída porque não consegue acompanhar e vai acabar bagunçando, atrapalhando a aula. E o mais grave, ela vai se desinteressar pelos estudos”, alerta.

Inês de Freitas Segundo, coordenadora pedagógica da Escola Mozart Pinto, informa que a Prefeitura de Fortaleza vem há algum tempo fazendo com os professores um trabalho de formação continuada, que acontece mensalmente.

Acrescenta, ainda, que é disponibilizado pelo Governo do Estado todo um material estruturado – o Programa de Alfabetização na Idade Certa (Paic) -, para diferentes faixas etárias e níveis de aprendizado. “Estamos trabalhando nessa linha de embasamento de um material que possa dar suporte à alfabetização para que a criança possa aprender”, esclarece.

O observatório do PNE informa também que, no ensino fundamental, a porcentagem de crianças de 6 a 14 anos matriculadas no Ceará em 2012 era de 93,8% (1.290.234), igual à média nacional (93,8%), enquanto os jovens de 16 anos que concluíram o ensino fundamental somavam 139.960 (70%), superando a média dos estados (67,4%).

No ensino médio, eram 445.302 jovens de 15 a 17 anos na escola em 2012 (82,8%) e 297.540 matriculados no ensino médio (55,3%), enquanto a média nacional foi de 81,2% e 54,4%, respectivamente. A partir do PNE, todos os planos estaduais e municipais de educação devem ser criados ou adaptados em consonância com as diretrizes e metas estabelecidas.

Problemas no Estado são estruturais

Apesar dos avanços que o Ceará vem apresentando nos últimos anos, muito ainda precisa ser feito para garantir uma educação de qualidade para todos. Na visão da pedagoga Raquel Dias, professora da Universidade Estadual do Ceará (Uece), ainda que se considerem alguns avanços no que diz respeito à redução da taxa de analfabetismo e elevação dos índices do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) no Estado, analisando o conjunto percebe-se que alguns problemas são estruturais.

“A não universalização da educação básica (0 a 17 anos), uma vez que a atenção concentra-se no ensino fundamental; a má qualidade do ensino público, revelada nos baixos índices de aprendizagem; a não valorização dos profissionais da educação, evidenciada no elevado percentual de professores temporários na rede estadual que alcança 60% do total e nas precárias condições de trabalho”, cita.

Em relação à meta que trata da destinação de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) para a educação, embora se apresente como uma conquista, afirma que na forma em que foi aprovada poderá inviabilizar a efetivação das metas direcionadas especificamente ao segmento público, pois possibilita a destinação de recursos públicos para a privada, através do Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies), do Programa Universidade para Todos (Prouni), de isenções de impostos, de bolsas. No entanto, a especialista destaca que não se trata de rever a meta, mas o próprio caráter do Plano, que se revela privatista.

Aplicação

Para melhorar os índices e a qualidade da educação pública do Ceará, Raquel afirma que seria necessário, em primeiro lugar, a aplicação imediata de 10% do PIB na educação pública. Junto com isso, redefinir prioridades do orçamento dos governos federal, estaduais e municipais, dando atenção especial à educação e às políticas sociais. Outra política nesse sentido que cita seria a definição de um plano de obras públicas visando a construção de escolas e creches.

Reginaldo Pinheiro, vice-presidente do Sindicato Apeoc, ressalta que o PNE é importante porque trata de questões fundamentais no que tange ao financiamento da educação. Ele afirma que hoje o Ceará investe 6,4% do PIB na educação, mas a meta é que seja 10% em 2024. Para isso, frisa que é necessário que os recursos dos royalties do petróleo e do pré-sal sejam contabilizados para a educação.

Outro ponto importante que o sindicalista pontua é em relação à formação, remuneração e carreira dos professores. “A gente considera central que até o 6º ano de vigência do plano o salário dos professores da educação básica seja equiparado ao rendimento médio (salário) dos demais profissionais com escolaridade equivalente”, salienta.

Efetivação

Para Pinheiro, o grande desafio é para que os estados e municípios possam, a partir de uma discussão com a sociedade civil organizada e os sindicatos, elaborar os seus planos com base nas metas do PNE. “Não tem mais a desculpa de que não há um parâmetro nacional”, destaca. Ele afirma que já se pode comemorar os avanços que o plano traz, mas reforça que a luta agora é para que as metas sejam alcançadas e se tornem política de estado, e não de governo.

“Temos que cobrar para que os governos efetivem o que está proposto no plano e que ele seja aprovado em consonância com a lei federal”, conclui Pinheiro.

 

 

 

Fonte: Diário do Nordeste